Biografia - parte II
(clique aqui para ler a parte I)
O prédio atual da Sociedade Harmonia Lyra, tem
esculpido em suas paredes, máscaras com coroas de louros feitas pelo artista, além de outros detalhes arquitetônicos. Certa vez, quando ia para uma noite de gala na Harmonia Lyra, por estar com a roupa suja de argila, "Ao ouvir dos porteiros que não poderia entrar sem gravata borboleta, foi até a sua casa e retornou à Lyra mais tarde - sem camisa e com uma gravata" (SCHWARZ, 2007).
Mascarões na fachada do Teatro Harmonia Lyra. Fotografia de Walter de Queiroz Guerreiro. Disponível em: http://www.mubevirtual.com.br/pt_br?Dados&area=busca&tipo=autor&autor=fritz%20alt.
Segundo Guerreiro (2007), a
primeira obra pública inaugurada no Brasil produzida por Alt foi realizada em
1925, um busto em bronze de Dona Francisca, que hoje se encontra na rua das
Palmeiras, no Centro de Joinville. Esse busto foi encomendado em comemoração
aos 75 anos da cidade pelo Dr. Marinho Lobo.
O busto da Dona Francisca foi
inaugurado em 9 de março de 1926, enquanto que o busto de Duque de Caxias foi
inaugurado em 25 de agosto daquele mesmo ano. Mas, é provável que o gesso de
Duque de Caxias antecedeu o bronze pelas dificuldades técnicas (GUERREIRO,
2007).
Busto de Dona Francisca. Foto de Cleber Gomes, extraída na reportagem "Busto Dona Francisca sofre ação de vândalos em Joinville". Disponível em notícia do Diário Catarinense: http://diariocatarinense.clicrbs.com.br/sc/noticia/2012/08/busto-dona-francisca-sofre-acao-de-vandalos-em-joinville-3848159.html.
Segundo o crítico de arte
Walter de Queiroz Guerreiro (2007, p. 9) no busto de Dona Francisca "por um lado Fritz Alt obedece aos cânones clássicos, por outro adota uma síntese, introduzindo um ritmo em
que as linhas contornam a figura, próximo ao Art Déco" (GUERREIRO, 2007, p. 9).
Em 1925 fica noivo de Léa Richlin, uma jovem de tradicional
família joinvilense e frequenta a loja maçônica “Amizade Alemã ao Cruzeiro do
Sul”. Assim, com o noivado e a vida em Joinville tomando
rumo, passa a ver tudo com mais otimismo, e percebe que era uma época alegre e
bela (HEINZELMANN, 1992).
Alt teve três filhos com
Léa: Gehrardt Ludwig, Ingeborg Alice e Gisela Regina, “marcados pelo
relacionamento complexo entre o amor e a boemia do artista” (GUERREIRO, 2007,
p. 9). Muitas vezes suas atitudes o levavam
a excessos alcóolicos e “atitudes de confronto com as normas vigentes na
cidade” (GUERREIRO, 2007, p. 9).
Fotografia de Fritz Alt. Autoria desconhecida. Disponível em: http://wp.clicrbs.com.br/anmemoria/2012/03/10/an-memoria-sabado-fritz-alt/?topo=84,2,,,,77
As longas ausências, a
companhia com a bebida faziam com que muitas vezes o relacionamento com Léa
estremecesse, sendo que Fritz certa vez confessou à amiga e discípula Edith
Wetzel: “Eu também não queria ser casado comigo” (HEINZELMANN, 1992, p. 31).
Heinzelmann (1992) conta que um certo dia Fritz saiu de casa para comprar a
carne do dia seguinte mas, às dezessete horas, o Stammtisch chamou sua atenção
para tomar uma cerveja e uma conversa – “no final da tarde do dia seguinte – em
casa todos preocupados – Fritz lembrou da carne, esquecida e toda podre no
selim da bicicleta” (HEINZELMANN, 1992, p. 31).
Tinha temperamento inquieto
e, por ser extrovertido, simpático e sincero, construiu um
vasto círculo de amizades na década de 30. Tanto no seu ateliê quanto fora de
casa tornou-se centro de debates culturais e formador de opiniões, pois tinha
fascínio pela arte, religião e filosofia, “a ponto de copiar textos lidos,
acrescentar ideias próprias e discuti-las” (GUERREIRO, 2007, p. 9).
Com esses
contatos, criou obras de arte funerária, projetando obras em granito e bronze, tradicional forma de sustento de escultores. Em 1936, Produziu algumas
obras-primas para a EFA (Exposição de Flores e Artes), exposição anual de
flores e trabalhos anuais, como “O Friorento” e “Wieland, o Ferreiro”.
"O Friorento", imagem extraída da reportagem "Verbete de bronze", de Rodrigo Schwarz. Jornal A Notícia de 25 de julho de 2007. Disponível em: http://www.an.com.br/anexo/2007/jul/25/0ane.jsp.
Além dos trabalhos em
escultura, Fritz Alt fazia o planejamento dos jardins da EFA. Fritz entregava suas
esculturas sempre de última hora e, “enquanto os demais iam para casa colocar
uma roupa social, Fritz ficava, esquecido da hora entre uma cerveja e outra, e
assim participava das solenidades de abertura” (HEINZELMANN, 1992, p. 28).
Dentre algumas obras em
locais públicos de Joinville, destaca-se o “Monumento ao Imigrante”, instalado
em 1951 na praça da Bandeira no Centro de Joinville em comemoração ao centenário de Joinville. Neste
monumento, há
um
imigrante, empunhando um machado, e um nativo, com uma espingarda. Na época da
produção da escultura, Fritz comentou com um amigo: ‘O caboclo diz o seguinte
para o imigrante alemão: a terra está aqui para ser usada, faça bom uso e seja
bem-vindo, mas não esqueça de que estou armado’ (SCHWARZ, 2007).
Monumento do Imigrante, foto de Rogério da Silva, extraída da reportagem "Precursor das artes plásticas", de Rafaela Mazzaro, do jornal A Notícia de 13 de maio de 2010. Disponível em: http://www.clicrbs.com.br/anoticia/jsp/default2.jsp?uf=2&local=18&source=a2901914.xml&template=4187.dwt&edition=14682§ion=1186
Esse Monumento surgiu a
partir de Rolf Wetzel, idealizador da Sociedade Amigos de Joinville, em 1947,
onde “Fritz Alt firma contrato e cria a obra que sintetiza as origens da cidade
e irá consagrá-lo junto à população” (GUERREIRO, 2007, p. 10). Erguido próximo
ao Marco Zero da cidade, na praça da Bandeira, perto do local onde os primeiros
imigrantes desembarcaram, próximo ao Rio Cachoeira (HEINZELMANN, 1992).
Monumento aos Imigrantes, de Fritz Alt. Foto de Juliana Rossi.
De acordo com a documentação da época, “o projeto inicial previa dois grandes triângulos em granito com altos-relevos sobre o homem do campo e o da cidade, possivelmente em momentos históricos diversos” (GUERREIRO, 2007, p. 23).
Como é provável que esses triângulos sairiam com um alto custo e cerca de cinco anos de serviço (HEINZELMANN, 1992), o projeto foi inviabilizado, fazendo com que Fritz Alt adotasse uma construção arquitetônica neoclássica, pois “dispõe o grupo de
personagens em bronze em torno de pedestal de granito, que pela dramaticidade
dos gestos expressa mensagem do romantismo e de um ideal: a instalação na nova
terra” (GUERREIRO, 2007, p. 10). Segundo Guerreiro (2007), os dois grupos
representam o passado e o futuro dos imigrantes, as gerações e a construção da família, deixando
à tona imagem do passado-presente.
Detalhe do Monumento ao Imigrante, de Fritz Alt. Foto de Juliana Rossi.
Através dos dois homens empunhando a arma de fogo e o machado, Alt representou aqui a tomada de terra e o desbravamento.
A mulher com seus pertences num baú e os dois filhos, “expressam a construção da família e das gerações futuras” (GUERREIRO, 2007, p. 23) e “futuro da nova pátria, a geração seguinte” (HEINZELMANN, 1992, p. 93). O monumento em suas laterais possui dois relevos que representam a chegada através do oceano, um com a Barca Colon na baía de São Francisco do Sul, com a vista da cidade, e outro que simboliza a penetração terra-adentro pela imigrante, através da subida da Serra Dona Francisca com carroças (HEINZELMANN, 1992; GUERREIRO, 2007).
Detalhe do Monumento ao Imigrante, de Fritz Alt. Foto de Juliana Rossi.
Alt gostava muito de ouvir
música clássica, o que o levou a criar algumas esculturas de seus autores
favoritos: Mozart (da qual existem apenas referências), Wagner, Chopin e
Beethoven. Beethoven foi modelado numa postura romântica, “como se fora vivo, a
expressão austera e turbulenta das paixões da vida, a cabeleira revolta captada
num átimo do tempo” (GUERREIRO, 2007, p. 10).
O escultor revela uma certa
obsessão pela transitoriedade da existência, pois foi influenciado pelas
leituras de Nietzsche, por sua experiência com a Primeira Guerra Mundial e por
sua própria existência. É nesse contexto que cria a máscara “A Vida e a Morte”,
simbolizando a metamorfose, “a revelação esotérica do homem, que passa pela
iniciação na qual Cristo é o símbolo supremo da transformação” (GUERREIRO,
2007, p. 10).
Vida e Morte, de Fritz Alt. Fotografia copiada do livro "Indicador Catarinense das Artes Plásticas", de Harry Laus e Nancy Therezinha Bortolin (2010).
Na década de 50, realizou muitos monumentos públicos, como
os de João Colin, no final da Rua João Colin em Joinville, Lauro Müller (em
Florianópolis), Marcílio Dias (Mafra), Emilio Carlos Jordan (Jaraguá do Sul),
Orestes Guimarães (São Francisco do Sul), Vidal Ramos (Rio do Sul) e Ermembergo
Pelizetti (Ibirama). É também nesse período que irá produzir dois painéis em
mosaico, no SESI e na Biblioteca Pública Rolf Colin.
Monumento a João Colin, de Fritz Alt. Fotografia de Walter de Queiroz Guerreiro. Disponível em: http://www.mubevirtual.com.br/pt_br?Dados&area=busca&tipo=autor&autor=fritz%20alt.
No mosaico do prédio do SESI – Serviço Social da Indústria, cerca de 58.015 pastilhas de vidro compõem a obra (5 m por 4,5m). Em 2006, foram enviadas uma a uma em Florianópolis para processo de restauração para enfim serem realocadas em nova sede do SESI. Em Florianópolis, todos os componentes do mosaico passaram por uma limpeza química, removendo a sujeira proveniente de mais de meio século de exposição aos gases emitidos pelos carros que trafegam pela rua Ministro Calógeras (SCHWARZ, 2006).
Painel de mosaico do Sesi, de Fritz Alt. 1949. Dimensões de 500 x 450 cm. Rua Ministro Calógeras, 195. Foto extraída do site: http://mosaicosdobrasil.tripod.com/id121.html
Em 1955 foi feito o mosaico da Biblioteca Pública Municipal Rolf Colin que, em sua parede frontal, tem proporções de 10 por 6,5 m. Nesse mosaico, é traçada uma evolução permanente do homem, “como uma linha constante ascendente que remete a Hegel e seus estágios de desenvolvimento do espírito” (GUERREIRO, 2007, p. 16). Há alegorias ao trabalho manual que caminha para o intelectual, “mostrando a evolução íntima do homem, do ser inconsciente ao onisciente” (GUERREIRO, 2007, p. 16).
Painel de mosaicos da Biblioteca Pública de Joinville, de Fritz Alt.. Disponivel em: http://mosaicosdobrasil.tripod.com/id121.html
Além de ser um escultor
dedicado a obras tridimensionais, trabalhos em cimento, estuque nas artes
decorativas e relevos, a criação artística de Alt estende-se a outras
linguagens que abrangem bicos-de-pena, desenhos, aquarela e pintura a óleo (GUERREIRO, 2007), mesmo que grande parte de sua produção não
foi localizada.
Em 2008 tornou-se destaque
no Dicionário da Escultura no Brasil, depois de 40 anos de sua morte. Redigida
por José Roberto Teixeira Leite, o artista foi incluído a partir do crítico e
autor do livro “Fritz Alt: vontade do desejo”, Walter de Queiroz Guerreiro, que
enviou o livro a José Roberto. Silvia Heinzelmann também escreveu uma biografia
sobre o escultor, em 1992.
Imagem de Fritz ALt trabalhando no busto de Lucy Paes, retirada da notícia"Verbete de bronze", de Rodrigo Schwarz. Jornal A Notícia de 25 de julho de 2007. Disponível em: http://www.an.com.br/anexo/2007/jul/25/0ane.jsp
Alt faleceu em 1968, no dia
15 de março, quase em frente ao Monumento do Imigrante, “[...] enquanto
percorria o trajeto de casa com sua inseparável bicicleta” (MAZZARO, 2010),
dois dias após a inauguração da Escola de Artes que leva seu nome, anexa à Casa
da Cultura. Neste dia,
[...] irá
proferir, a contragosto, uma vez que não gostava de atuar como professor, uma
palestra inaugural sobre história da arte. Fatalidade ou emoção, no dia
seguinte após discussão com seu vizinho, o historiador Carlos Ficker, por uma
questão de divisas de terras, sobre infarto do miocárdio com parada
cardiorrespiratória (GUERREIRO, 2007, p. 11).
Em seu enterro refletiu-se o
ecletismo de seus interesses, pois havia representantes da Maçonaria, do
Exército, da Igreja, do Exército, inúmeros amigos inclusive dos segmentos
políticos e culturais (HEINZELMANN, 1992).
Pietá de Fritz Alt. Foto: Lysandro Lima. Disponível em: http://www.sctur.com.br/joinville/museu_fritz_alt.asp
Teve como discípulo Mário Avancini e, “juntamente com Eugênio Colin e Victor Kursancew é considerado pioneiro das artes plásticas na cidade e
esta é a sua principal importância”, afirma Francisco Cardoso, no artigo “O
Famoso Desconhecido Fritz Alt e sua Casa”, publicado em 17 de agosto de 1988 no
Jornal “A Notícia” (HEINZELMANN, 1992). Fritz “não tinha apego material às
coisas. Gostava de arte, gostava de música, gostava de beber e conversar com os
amigos, e nisso se resumia o seu universo” (VIEIRA, 1989 apud HEINZELMANN,
1992, p. 102).
(clique aqui para ler a parte I)
FRITZ
Alt, o artista ancestral. Jornal A Notícia, Joinville, 9 mar. 2011. Anexo,
Caderno de aniversário do A Notícia, p. 30.
GUERREIRO,
Walter de Queiroz. Fritz Alt: a vontade do desejo. Joinville: Editora
Letra´dágua, 2007. 1ª edição.
HEINZELMANN,
Silvia. Fritz Alt. Joinville: Fundação Cultural, 1991.
MAZZARO,
Rafaela. Percursos das artes plásticas. Jornal A Notícia, Joinville, 13 mai.
2010. Anexo, p. 1.
SCHWARZ,
Rodrigo. Verbete de bronze. Jornal A Notícia, Joinville, 25 jul. 2007. Anexo,
p. 1.
______.
Vida nova ao trabalhador: Restauração de mosaico recupera obra monumental de
Fritz Alt, baluarte das artes plásticas de Joinville. Jornal A Notícia,
Joinville, 15 out. 2006. Anexo, p. 2.
TERRAS
da princesa brasileira abrigam arte musiva do alemão Fritz Alt. Disponível em:
http://mosaicosdobrasil.tripod.com/id121.html. Acesso: 15 jan. 2013.