Esse texto sobre o busto de Orestes Guimarães, foi encontrado no site do ClicRBS. Foi postado por Izabela Lis em 2009 e conta com a participação do crítico de arte Walter de Queiroz Guerreiro com um texto sobre sua importância artística. Confira:
"A hora do nascimento
Busto de bronze de Orestes Guimarães exposto na Escola de Educação Básica Conselheiro Mafra, em Joinville
Imagem do gesso de Orestes Guimarães doado ao Museu Fritz Alt
Parte deste texto abaixo foi publicada na capa do caderno Ideias deste domingo. Leia o conteúdo, na íntegra, redigido pelo crítico Walter de Queiroz Guerreiro.
GESSO DOADO AO MUSEU CASA FRITZ ALT POSSIBILITA ANÁLISE MAIS PROFUNDA DO PROCESSO DE CRIAÇÃO DO ARTISTA ALEMÃO QUE MOROU EM JOINVILLE
Walter Guerreiro*
Em princípios deste ano, a doação de uma obra de arte ao Museu Casa Fritz Alt aclarou novos aspectos nos processos artísticos de criação do artista que viveu onde hoje é exposto seu acervo. Trata-se de um busto e gesso de Orestes Guimarães, doado por Ivo Koehntopp e que pertenceu ao pai Paulo Erwino Koehntopp (1910-1973), proprietário da Marmoraria A. Koehntopp & Cia. Ltda. Paulo Erwino foi amigo pessoal de Fritz Alt, companheiro de trabalho na execução de pedestais e túmulos e de muitas conversas e boemia. Se, inicialmente, pode-se pensar ser um busto idêntico ao bronze existente no Monumento da Escola de Educação Básica Conselheiro Mafra, no Centro de Joinville, olhando mais de perto, podemos notar diferenças substanciais que não foram causadas pelo transcorrer do tempo.
Voltemos às origens do monumento e ao período do governo municipal de Rolf Colin (1951-1956), sabendo-se pelo registro inicial de Silvia Heinzelmann que a obra é de 1955, embora o bronze não seja datado. O período de governo de Rolf Colin foi favorável a Fritz Alt, datando dessa época obras marcantes como o mural em mosaico da Biblioteca Municipal, o Monumento a Getúlio Vargas (inaugurado depois disso) e este a Orestes Guimarães.
Sabendo que Fritz Alt, ao realizar bustos de personagens históricos e mesmo em assuntos de seu interesse, partia de referências pré-existentes, buscamos as fontes iconográficas nos retratos de Orestes Guimarães.
Não encontramos imagens, embora tenhamos pesquisado nos jornais "Gazeta de Joinville" (1911) e "Commercio de Joinville" (1911), Arquivo Histórico de Joinville, arquivo do jornal "A Notícia" (1955), Arquivo Público do Estado de São Paulo e Divisão Iconográfica da Biblioteca Nacional. Aquela que deve ter sido fornecida ao artista, possivelmente pela prefeitura, perdeu-se.
O gesso e o bronze
Se compararmos as dimensões e imagens dos bustos em gesso e bronze, saltam à vista divergência já nas dimensões. Há uma diferença de 30 centímetros na altura. O rosto é mais alongado, sobrancelhas mais unidas, olhar tristonho, base do nariz alargada (embora possa advir do restauro posterior). Chamam principalmente a atenção, a existência de uma platibanda na base, formando degrau, e duas abas nas laterais com recorte em secção curva, injustificadas esteticamente, e que acarretariam problemas para uma futura fundição em bronze. Ora, o busto desde o desenho inicial foi projetado para ser encastoado no pedestal de granito, e se compararmos o formato das abas com o formato do topo do pedestal, fica claro que elas serviram como simulação do trabalho de cantaria, apontando protótipo com fins demonstrativos na encomenda.
Até agora, sempre tínhamos visto que a modelagem em argila do artista era a definitiva, bastando lembrar "A Onda e o Rochedo" e "O Índio" nos diferentes estágios, portanto, sendo a modelagem inicial a origem de um gesso idêntico ao bronze fundido, o que aqui não ocorre.
Este monumento aliás, é a única obra conhecida em que existe no baixo-relevo a inscrição "fundido por Fritz Alt e filho" (no caso, Gehrard), apontando para a importância dada. Além disso, nesse período, o pedestal conquista importância, havendo colaboração de Mário Avancini em dois casos, ambos apicoados em granito rosa de Garuva, o de Getúlio Vargas e este, executados na Marmoraria Koehntopp.
No de Getúlio Vargas, o pedestal escalonado tem uma secção curva na lateral direita que conduz o olhar para o busto, neste mais elaborado aproxima-se do impacto do Monumento ao Imigrante. Desde seu projeto original, a intenção foi de criar planos sobrepostos gerando volumes, aos moldes de Jobstschmidt, da Escola Bauhaus. Trata-se de uma forma concebida como sucessão de formas retas, colocadas proporcionalmente umas sobre as outras, um estilo que foi denominado "estilo arranha-céu" nos anos 30 e que, como art dèco tardio, aparece em São Paulo nos anos 40.
O monumento apresenta problemas de proporção entre as dimensões do busto e do relevo, e que agora, pensando no acréscimo dos 30 centímetros originais, alcançaria o efeito desejado. Mas o seu maior problema ainda está na implantação em local exíguo, faltando espaço de respiro no entorno do monumento para visualização adequada.
Obra criada com carinho, de um mestre para outro, mais uma vez o artista nos surpreendendo, no resgate de um processo artístico a que intuímos, nos desvãos da memória.
Personagem materializado em bronze
O professor Orestes Guimarães (1871-1931) é figura quase esquecida, embora como personagem histórico ligado à educação em Santa Catarina tenha tido papel relevante. Em 1906, o governador Abdon Batista convidou o professor Orestes Guimarães, aluno de Caetano de Campos e mestre formado na primeira geração de normalistas republicanos, para implantar a reforma da Instrução Pública Pós Monarquia no Colégio Municipal de Joinville. Calcado em ideário republicano e positivista, Orestes Guimarães acreditava que a instrução pública deveria partir da formação de professores primários, através de valores de nacionalidade, higiene e, acima de tudo, obediência aos princípios fundamentais da democracia pelo respeito às instituições, liberdade de palavra, tolerância e fraternidade. Em 1911, com a reforma aprovada pelo governador Vidal Ramos, o Colégio Municipal de Joinville - que já havia sido Escola Pública do Padre Carlos desde 1882 e primeiro estabelecimento de ensino em Joinville - passa a ser o Grupo Escolar Conselheiro Mafra, com a substituição da escola primária com um único professor para a seriação, com múltiplos professores. Adapta-se, então, o prédio com maior número de salas, galpões, gabinetes administrativos, quadros negros, mobiliário escolar e, principalmente, literatura didática, conteúdo programático e sugestões de atividades didáticas.
* Walter de Queiroz Guerreiro é historiógrafo e membro
da Associação Brasileira de Críticos de Arte."